Título original: The heart is a lonely hunter
Tradução: Sonia Moreira
Edição: Companhia das Letras, 2007.
O coração é um caçador solitário é o
romance de estreia da autora norte-americana Carson McCullers, publicado pela
primeira vez em 1940. O livro foi sucesso de público, colocando sua autora na
lista de mais vendidos.
O
cenário do romance é em uma cidade do sul dos Estados Unidos no final da década
de 30. Os capítulos alternam o foco narrativo de um personagem para o outro,
como inicial apresentando-nos à amizade entre os únicos mudos da cidade – o
grego Antanapoulos e o judeu Singer. A rotina calma dos dois deixa de existir
quando Antanapoulos começa a apresentar comportamento violento, desencadeando a
decisão de sua família de interná-lo. Singer vai morar em um quarto de um
pensionato e, aos poucos, novas figuras começam a surgir em sua vida.
Biff
Brannon é dono de um restaurante em que trabalha com sua mulher, Alice. Tem
como hábito acompanhar avidamente as notícias e arquivar jornais. Mick é filha
dos donos do pensionato e obcecada com música. Seu maior desejo é poder
aprender a tocar um instrumento, mas as condições de sua família fazem desse um
sonho impossível. Jake Blount, de passagem na cidade, é um trabalhador que sonha
com uma revolução comunista. Benedict Copeland é o médico da cidade, que
trabalha exaustivamente e vê em seus filhos o fracasso do sonho de superar pelo
estudo o terrível fardo da escravidão que carregam os negros americanos. Singer
é o ponto fixo em torno do qual esses personagens orbitam, ocasionalmente
vislumbrando uns aos outros e, dois momentos pivotais do livro, encontrando-se
todos.
A
amizade de Singer com essas pessoas é fudamentada, principalmente, no desejo
delas por comunicação. Sua mudez o faz quase um ser místico para os personagens
que enxergam no seu silêncio a compreensão de suas angústias mais internas, que
hesitam em verbalizar com alguém que possa de fato respondê-los. Singer, no
entanto, sente-se solitário sem Antanapoulos - seus sentimentos por ele são
próximos aos de ordem romântica, mas em nenhum momento é explicitado se é essa
a natureza do relacionamento dos dois – e enxerga nessas pessoas a
representação da ausência da compreensão que acreditava encontrar em seu amigo
mudo.
A
impossibilidade da comunicação real e suas consequências é o fio condutor da
narrativa e também o guia os personagens aos seus desfechos: os planos
arruinados de Mick, o fracasso do sonho de Dr. Copeland, a desistência e
partida de Jake e a solidão cada vez mais intensa de Biff. A prosa de McCullers
é fluída e objetiva, mudando levemente seu tom para dar conta melhor do
personagem que recebe o foco narrativo em cada capítulo. São particularmente
pungentes os capítulos dedicados ao Dr. Copeland e à Mick. Apesar da vida
miserável e árida das suas personagens, a autora acerta ao conferir às vidas
interiores deles – Mick, inclusive, explicita essa divisão ao referir-se à sua
obsessão com música e com Singer como “o mundo de dentro” – é complexa e rica e
a negociação entre a realidade e a interioridade surge como um processo
dolorido reservado a todos os personagens.
Publicado
quando a autora tinha apenas 23 anos, O
coração é um caçador solitário explora a miséria humana enquanto consciente
das diferentes forças sociais que a causam, criando uma vívida imagem e
personagens tocantes e complexas.
Nota: ❤❤❤❤